Do silêncio

O silêncio é a malícia que não foi compartilhada. É o vácuo do diálogo. Quem não fala esconde; quem esconde, entende; quem entende, não atende. Meu silêncio não basta. Não deveria bastar; pra ninguém! Aceitar o silêncio é inocência. Partilhar dele é corvardia. Um pensamento não compartilhado acumula mais palavras que um discurso. A maior prova da injustiça desse fôlego economizado é que nenhuma resposta é válida se não for dita. O silêncio é a preguiça da fala.

Ando quieto demais, fiquei com remorso e precisei escrever.

Do lado de dentro

Meu peito é oco. Tenho o costume de andar com o coração na boca. Por isso nunca tenho palavras. Posso, no máximo, emprestá-las de você. Todas as palavras são suas e eu só pronuncio. Nunca em voz alta pois o amor tem o sono leve; ele não dorme, só sonha.

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À procura do coração,
A razão bateu na porta do peito.
O coração não estava, pois subiu pra boca.
Então, a razão também subiu
Mas na boca não havia espaço pra ela.
A razão quis entrar, gritou alto.
O amor acordou,
O coração saiu.

E então discutiram e brigaram.

A boca, que já não sabia mais o que dizer, também brigou, pois haviam roubado suas palavras
Acabaram acusando o amor de tal crime.
Ele se defendeu - dizendo:
- As palavras saíram todas abraçadas, umas com as outras, em forma de estrofes.

Saíram todos à procura das palavras

Mas no meio do caminho,
O amor  voltou a sonhar,
O coração voltou pra boca
E a razão se perdeu.


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